Psicoterapia científica e fenomenológica visto nas Constelações Familiares.

Psicoterapia científica e fenomenológica

A psicoterapia fenomenológica se encontra em certa contradição com relação à psicoterapia científica. A ciência experimental quer descobrir, através da experiência, modelos reproduzíveis para que o mesmo resultado possa ser alcançado através do mesmo procedimento. Isso pode ser feito de modo relativamente fácil nas ciências naturais, alcançando, através da mesma experiência, os mesmos resultados. Na alma isso não é possível.
Quando queremos nos dedicar cientificamente à psicoterapia e pesquisar cientificamente aquilo que ajuda, então as experiências devem ser colocadas de tal forma que o elemento pessoal fique excluído e o importante fique sendo somente o externo. Contudo, como podem observar aqui,o pessoal é o mais importante.Não podemos obter nenhum resultado válido se não levarmos o pessoal em consideração.Esta é uma parte.
A psicoterapia científica é linear, isto é, aqui atua uma determinada causa e ali resulta um determinado efeito.
A psicoterapia fenomenológica,ao contrário, significa que eu, como terapeuta,me exponho a um contexto sem intenção e sem temor. Portanto, também sem a intenção de curar. Por isso, o terapeuta que quer perceber fenomenologicamente precisa estar de acordo com o mundo tal qual ele é. Não tem nenhuma necessidade de transformar o mundo. Isso exige que se recolha totalmente. Também está de acordo com a doença de um cliente,tal como ela é.Não tem a necessidade de interferir.
É diferente para o médico, porque esse pode e deve também trabalhar, em grande parte, cientificamente. Quero diferenciar isso bem claramente.
Mas aqui não dá. O terapeuta se recolhe totalmente e se abre a um contexto maior. Por isso,quando trabalho com um cliente,sempre olho também para seu sistema. Olho principalmente, para as pessoas que estão excluídas,que nem aparecem lá,mas que eu,porque me recolho,percebo com a visão e o sentimento. Imediatamente, elas têm em mim o lugar que lhes é negado. Tão logo tenham esse lugar em mim, estou mais em profunda harmonia com o sistema do que o próprio cliente, porque tenho maior compaixão por seu sistema.
Então,quando me recolho e me exponho ao todo,sem intenção e sem medo do que poderia vir à luz, percebo repentinamente o essencial, aquilo que ultrapassa os fenômenos visíveis. Percebo, então, que este é o ponto.
Isso é importante, sobretudo para a solução. A colocação da constelação é relativamente fácil. Mas só posso encontrar a solução quando estou em harmonia com isso. Então ela reluz repentinamente. Esta é a percepção fenomenológica. É como um relâmpago e está sempre em harmonia com algo maior. E é sempre uma percepção com amor, e isso é o decisivo. Então, podemos nos deixar levar.
Por isso, esse tipo de trabalho não pode ser aprendido, como quando se aprendem regras, mas o essencial é que nós nos deixemos levar por este tipo de percepção e que adquiramos isso através de exercício e acompanhamento. Então pode-se proceder assim.
Quando, no trabalho com um cliente, vejo que não existe solução, então levo isso bem a sério e me recolho, mesmo que me cause dor. Mas quando me recolho isso não me causa dor. Quando me sinto em harmonia, isso não pode me causar dor. Preciso estar totalmente nessa harmonia. Então, fico na minha percepção e não me deixo desviar por nada, por nenhuma objeção.
É claro que também cometo erros. Isso está bem claro para mim. Assim, é necessária uma ressonância de participantes atentos. Eles vêem de repente algo que eu não tinha visto. Então, confio na percepção deles.
Contudo, quando num trabalho com um cliente, ao qual confronto até as últimas conseqüências de seu comportamento e, por exemplo, se alguém se alia a esse cliente – porque isso causa medo a si próprio – se intromete e diz que não posso fazer isso, então não devo me deixar levar pelo seu medo, porque isso me enfraqueceria imediatamente.
O terapeuta que trabalha assim é no fundo um guerreiro.Em seus livros sobre o indígena Don Juan, Carlos Castañeda descreve, de uma maneira excelente, o que é ser um guerreiro.O guerreiro, nesse sentido, não tem qualquer medo do limite extremo. No limite extremo, tudo pode falhar ou tudo pode dar certo, tanto um quanto o outro.Contudo, na prática experimentei que quando o terapeuta vai realmente até esse limite extremo, geralmente dá certo. Mas o risco continua. Quem se atemoriza perante o risco não pode trabalhar dessa forma. Porque nas coisas essenciais, onde se trata de vida e de morte, a decisão é sempre tomada no limite extremo, não antes.
Nesse tipo de psicoterapia o que vem à luz é, ao mesmo tempo, uma instrução para a qual, talvez, precisemos nos entregar, mesmo que não a entendamos. Porque o que realmente é, e para onde conduz, torna – se visível somente no final, não no início.

                               Amplidão
Gostaria de dizer algo sobre a amplidão. Muitos problemas surgem porque nós nos agarramos, por assim dizer, ao próximo e ao estreito. Quando olhamos para os nossos problemas, ou para os problemas num relacionamento, ou outro qualquer, então olhamos muitas vezes apenas para o estreito, o próximo, o nítido, e todo o contexto a que isso pertence, nos escapa. Entretanto, o estreito e o próximo só têm o seu significado e sua força na ligação com aquilo que os ultrapassa. Por isso, via-de-regra, a solução consiste em ir para além do estreito e do próximo para o distante, para o amplo. Então, em vez de olharmos para nós mesmos, por exemplo, para os nossos desejos e para aquilo que vemos como nossos problemas ou como nossas feridas ou nossos traumas, olhamos para os nossos pais, para a família. De repente, estamos ligados a algo mais, estamos ligados a muitos. Então, aquilo que experimentamos como algo nefasto ou que causa sofrimento tem seu lugar em um contexto maior.
Mas quando olhamos somente para a família, depois de algum tempo, a visão fica novamente estreita. Precisamos então ultrapassar com o olhar para além dela, incluir de novo o todo em nossa atenção, percepção e também em nosso amor e abrir - nos. Então existe um caminho para fora daquilo que talvez pareça ser insolúvel na família.
Existe, também na psicoterapia, um desenvolvimento em direção à amplidão. Existe a psicoterapia que se dedica preponderantemente ao indivíduo, por exemplo, aos seus sentimentos. Aí, talvez tudo seja desmembrado, entretanto o indivíduo não ultrapassa a si próprio.
Existe também a terapia familiar que inclui o contexto maior. Ela pode trazer soluções que não são possíveis na terapia individual. Contudo, a terapia familiar permanece ainda limitada.
Então se pode ir além da terapia familiar, para algo maior. Isso se torna possível se nos deixarmos conduzir pelos movimentos da alma, pois esses movimentos caminham em direção a algo maior.



Extraído de um livro de Bert Hellinger